cDANIELA ASSAY AG Manaus
Remédio popular usado contra mais de 50 tipos de doenças, o óleo de copaíba ganhou respaldo científico. Substância combate leishmaniose, câncer, bactérias e inflamações.
Conhecimento cientifico significa aventura no meio da Floresta Amazônica. A Reserva Ducke é uma espécie de laboratório vivo do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa). No caminho em busca da copaíba dá para entender por que a Amazônia é chamada de farmácia viva.
“O principal uso do breu é para dor de cabeça. Eles fazem um tipo de incenso e usam para dor de cabeça”, conta o pesquisador Valdir Veiga Jr., da Universidade Federal do Amazonas (Ufam).
O leite-de-amapá cura até tuberculose. É docinho e tem gosto de leite. Mas e a copaíba? Depois de três horas, chega-se a uma das matrizes. “Atualmente temos um método de extração em que furamos até o centro da árvore, coletamos o óleo e depois colocamos um cano de PVC. Fazemos uma rosca em cada uma das extremidades e acoplamos na árvore. Assim, na próxima coleta, não precisamos furar de novo. Isso protege a árvore contra a entrada de agentes causadores de doenças, como fungos e cupins”, explica a pesquisadora Raquel Medeiros, do Inpa.
As copaibeiras estão dispersas pela mata, mesmo em uma área onde a espécie é abundante, as árvores podem estar até um quilômetro distantes umas da outras. O óleo produzido lá dentro é um mecanismo de defesa contra pragas naturais, como cupim. É como se a árvore fabricasse o próprio remédio.
Entender a dinâmica das copaibeiras, como elas crescem e se desenvolvem, é o primeiro passo para preservar a espécie. Afinal, ela vem demonstrando ser uma importante matéria-prima para a ciência.
“Temos encontrado substâncias muito interessantes nas cascas, como o ácido betulínico, que está em fase de testes para o tratamento do vírus HIV”, revela Valdir Veiga Jr.
Remédio popular usado contra mais de 50 tipos de doenças, o óleo de copaíba ganhou respaldo cientifico. Na Ufam, o professor Valdir Veiga Jr. coordena um grupo que estuda há dez anos os benefícios desse óleo valioso. “Já conseguimos comprovar atividade contra leishmaniose. Algumas copaíbas têm efeito antimicrobiano e um dos principais achados foi a atividade anticancerígena”, diz.
Mas atenção: nem todos os óleos de copaíba são iguais “Os óleos do Rio de Janeiro e de Minas Gerais não têm a mesma composição química e, portanto, não vão ter as mesmas ações farmacológicas do óleo da região de Manaus, por exemplo. Mas existe uma atividade comum a todas as espécies de copaíba: a ação anti-inflamatória”, explica o pesquisador.
Anti-inflamatório poderoso que a mãe da funcionária pública Mary Jane Almeida receitava para a filha, que cresceu e começou a receitar para seus filhos. O remédio está logo na cozinha. Afinal, o tratamento é à base de óleo de copaíba.
“De manhã, o tempo é muito curto para fazermos várias coisas. Deixamos uma bancada com o óleo à mão para fazer o que tem que ser feito e não deixar de dar a gororoba, como nos chamamos”, conta Mary Jane.
E para onde vai a “gororoba”? As crianças se animam, mas logo a empolgação acaba. O remédio é eficaz, mas o método um pouco aflitivo: é preciso passar o dedo com uma gaze embebida no óleo na garganta. E nem os adultos escapam.
“A copaíba tem um gosto forte, mas não é tão incômodo assim. O pior é a maneira de passar”, diz a enfermeira Andréa Rodrigues. “Funciona mesmo. Em dois ou três dias já estamos bem. É ruim, mas vale a pena. Se não valesse, não deixava enfiarem o dedo na minha garganta”.
Bom para garganta e breve será um poderoso tratamento para os dentes. Pesquisadoras da Ufam descobriram que a copaíba pode ser usada na composição de produtos odontológicos. A proposta das cientistas é usar a copaíba no tratamento de canal que, segundo elas, vai ficar mais eficiente e barato.
“O tratamento chega a ficar seis vezes mais econômico”, calcula a pesquisadora Ângela Garrido, da Ufam.
Com um futuro tão promissor, a copaíba tem conquistado aliados importantes. “Naquele tempo eu não tinha esclarecimento e derrubava muita madeira sem necessidade. Daqui para frente eu quero é preservar”, afirma o agricultor Serafim de Abreu.
Plantar ao invés de desmatar. Seu Serafim sabe o bem que está fazendo. Ele é voluntário de um projeto do Inpa que incentiva o replantio de árvores em áreas desmatadas de um assentamento agrícola. Sozinho, ele limpa o terreno e espanta lembranças do passado. “Quanto mais eu encher toda a área que eu desmatei melhor para mim”, diz.
Plantando copaíba junto com a lavoura, em lugar de pouca ou nenhuma sombra, ele tem surpreendido os pesquisadores, que acompanham, entusiasmados, o crescimento das árvores de seu Serafim.
Quando chegaram, as mudas tinham pouco mais de um palmo. Três anos depois, estão com mais de 1,80 metro. Na floresta as árvores atingem mais de 30 metros de altura. Só vão produzir o óleo na fase adulta, daqui a cerca de 30 anos. O que levam alguém a gastar tempo e suor em um investimento a tão longo prazo?
“Plantar pau-rosa, amapá, copaíba é uma caderneta de poupança para o futuro. Eu pensei muito isso. Não plantei mais porque não tinha muda. Se mais eu tivesse, mais teria plantado”, finaliza seu Serafim.
Texto do site do Globo Reporter
Video Complementar: http://youtu.be/U7b5XMfOQwI